sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Velha carta de amor

Há quem diga que a distância atrapalha. Não que eu discorde. Atrapalha, complica, às vezes machuca. Talvez até deva confessar que não são tão poucas vezes como gostaria. Eu diria que é inevitável a solidão bater na porta, assim, sem avisar. Fica inevitável não respirar fundo e olhar pros lados, numa tentativa frustrada de dissolver os pensamentos. Então vem a pergunta; será que foi assim que você imaginou que seria? Os seus olhos sozinhos, fitando o horizonte com a esperança incerta de que em algum lugar distante, outros olhos estejam tão perdidos no horizonte quanto você; apenas buscando pelos seus. Não se sabe ao certo se é reflexo do pôr- do-sol, o brilho dos primeiros raios refletidos no mar, daquele dia que não sai da memória; ou uma lágrima escorrendo sem alarde no canto do rosto. O brilho daquele momento cego de amargura.

Tudo se move de esperança; ainda que por vezes pareça completamente estacionado em local proibido, perigoso. Se move. De uma parte a outra do globo, não interessando a distância, as estrelas permanecem no mesmo lugar. Pode parecer tolice; mas quando eu me deito no chão do quintal e aponto pra estrela que um dia atendeu o meu pedido; eu peço que, ainda que em outra parte do globo, da sua sacada, você se lembre de apontar pra ela também. Assim eu sei que estamos olhando juntos, na mesma direção. Eu apontando pra você e você pra mim, e em linha reta nos cruzamos em algum lugar do infinito; ainda que seja nos meus sonhos.

O tempo passa devagar. Os segundos parecem horas, e as horas, anos. Será que foi assim que você achou que seria? Há quem diga que a distância atrapalha. Que graças a ela um grande amor não acontece. Eu só queria te confessar que às vezes a distância dói, machuca. Por vezes, algumas situações me inebriam os sentidos e eu me vejo perto de você; eu te vejo sonhando meus sonhos, sentindo meus beijos, me envolvendo em teus abraços. Eu escuto a tua voz e graças a um súbito impulso disparando em meu peito eu te procuro em todas as direções.

A distância atrapalha, sim. Mas eu me lembro da cor dos teus olhos; me lembro do teu olhar. Me lembro do timbre da tua voz e do efeito sobre a minha pele. Eu me lembro do toque, me lembro do gosto, eu sinto teu cheiro passeando com o vento e espero que ele ainda leve o meu até você. Eu ainda lembro do teu jeito embaraçado, das covinhas no sorriso, do seu lado da cama e do seu suspiro rouco e embargado. Lembro do seu jeito de abrir os olhos depois do beijo, lembro do beijo. Eu lembro a forma que você me olhava quando achava que eu ainda estava dormindo. Lembro das noites que eu te vi dormir, do teu sorriso, da tua manchinha no dente e do tom da tua pele. Eu ainda lembro o que você me pedia, como você me pedia, do que você gostava. Lembro do jeito que você me olhava, das suas fitadas nos meus olhos, na minha boca e das análises detalhadas; como quem grava no fundo da alma com todos os detalhes. Eu ria por dentro; talvez agora eu entenda o porquê.

Tudo se move. Move. As coisas são como você achou que seria? Nada mais é como antes. Talvez seja mais, talvez menos. Ou quem sabe percepção. Mas o antes já ficou pra depois e no depois só me importa o agora. Eu precisava confessar que às vezes dói; talvez deva confessar que não são tão poucas vezes como eu gostaria. Mas entre segundos, horas, anos e todos esses séculos nos quais eu não tenho como sentir o teu calor; nada tem força o suficiente pra me levar pra longe de você. Ainda que às vezes eu olhe perdida pro horizonte e uma lagrima insista em cair, ainda que a minha esperança seja sempre incerta, que a minha insegurança me corroa a confiança, que as minhas dúvidas se misturem aos meus medos, ainda que o passado por vezes me atormente e que as tuas dúvidas se façam minhas; ainda que eu não tenha encontrado o equilíbrio e o jeito certo de viver sem me bagunçar com tudo isso; eu acho que estamos indo bem. Por que NADA tem força o suficiente pra me levar pra longe de você.

Eu precisava te confessar que está difícil. E acho até que está tudo bem; ninguém precisa se sair bem o tempo inteiro. Ninguém precisa estar bem o tempo todo. E eu ainda acho que estamos indo bem. É flagrante; você pensa cada dia mais, sonha cada dia mais, deseja cada dia mais. Não tem dor que se compare a saudade. Onde você está agora? Continua acordando de mau humor? Será que perdeu a mania de balançar a perna quando fica nervoso? A dor da saudade é tentar, ainda que em vão, não pensar nas tuas risadas que não sou eu quem escuta, nos teus beijos que não são meus, nos carinhos que não sou eu quem faz, que não é o meu rosto que você vê quando acorda, no teu dia a dia que não sou eu quem vive. Precisava confessar que eu tenho inveja; tenho ciúmes, talvez um pouco de raiva. Que por vezes eu me descontrolo e entre sonhos esfumaçados me sinto impotente. Talvez eu espere muito, te cobre muito. Te deseje muito; muito.

É inevitável não pensar; não pensar no que eu quero, no que eu preciso; não pensar em você. Mas eu te sinto tão perto, e talvez agora eu precise ouvir de novo o som da tua voz dizendo que me ama; me dizendo que eu preciso de você e que você também precisa de mim. Se a distância atrapalha? Confesso que eu tentei não deixar chegar tão longe assim; mas não consegui.

E é por causa da distância que se aprende a dar valor; encontros, beijos e abraços viram sonhos. Os sonhos mais intensos que eu já sonhei. Que me fazem forte pra tudo o que vier. Dois corações passam a ser um só e a certeza de saberem-se ali domina qualquer solidão. Os planos são feitos de desejo puro. E o fato de pensar que seja de que canto for, olhamos na mesma direção, nos coloca juntos o tempo todo. Aprende-se a dar valor pras palavras, elas se tornam nosso elo forte e valem todas as que são ditas. Valem as não ditas, valem os sentimentos. Vale o olhar se cruzando, cada gesto. Cada detalhe vale, vale muito. Só quem vive pra saber.

A distância é algo que só quem enfrenta entende o valor de uma foto, uma carta, uma recordação. Só com a distancia você entende que pra reviver, basta relembrar. Felicidade, ainda que sem tamanho, não é medida em dias, anos ou séculos, e sim, por instantes. E não há felicidade que se iguale a que eu sinto por te saber aqui dentro do meu peito. E todas as vezes que eu lembrar, ninguém entenderá o motivo do meu riso.

Ninguém mais entenderia o valor que tem um segundo para poder te olhar.. um, ou três.. Eu tenho certeza que hoje, eu daria o mundo pelo teu abraço. Mas eu tento ser paciente; não precisa ser fácil o tempo todo. Não desisto de persistir um pouco mais, mesmo que entre lágrimas; o que há de errado com isso afinal? Eu acredito no tempo reservado pra nós em algum lugar desse caminho.

Amar você é enlouquecer sem perder um pingo de sanidade. É conhecer toda a grandeza de sentir, seja onde for e ter a certeza de que é exatamente como eu achei que seria.

28 de junho de 2007.